Grávidos de redes e dentro das quais engravidam mulheres também, os barcos regionais zarpam do porto de Manaus, a qualquer hora do dia e da noite e cruzam os rios Negro e Solimões, transportando homens, mulheres e crianças tristes por constatarem que na capital não é mais local para realização de sonhos, por culpa do desemprego nas indústrias, violência, falta de saneamento básico e grande riqueza das indústrias que exploram a mão-de-obra dócil e barata, sem qualquer contrapartida social.
Em meio à quietude e escuridão do Rio Negro e das barrentas e violentas águas do Rio Solimões, os barulhentos barcos regionais, sob as bênçãos de Deus, deslizam sob o olhar atento da lua e das estrelas, transportando a desilusão da ilusão de pessoas que buscaram realizações profissionais na capital e que retornam com a certeza de suas frustrações pela falta de oportunidade de emprego, ainda vivos diante da violência que mata sem perguntar nada, livres das drogas ou envolvidos com elas, mas tentando abandoná-las. Enfim, é uma cena triste, mas real e os barcos apenas ajudam a transportar passageiros sem lhes fazer quaisquer perguntas.
Durante o dia, botos navegam acompanhando os barcos regionais, mas, ao contrario das lendas, não se transformam em homens elegantes de branco e não engravidam moças incautas que apenas sonharam com seus príncipes encantados que não os encontraram como desejavam entre os jovens que conheceram e namoraram na cidade grande! A esperança poderá estar no próximo porto, no próximo namoro – quem sabe não seja um príncipe encantado de verdade?
Muitos se perderam pelos caminhos tortuosos dos vícios, nas vielas sombrias, fedorentas, escuras e esburacadas da capital e derraparam em seus sonhos. Decidiram retornar para terem as mãos calejadas em suas terras, fugindo da agressão da polícia em despejos de terrenos realizados quase sempre com uso da força; é melhor um calo na mão de um cabo de terçado ou machado do que viver correndo da polícia na capital em busca de um pedaço de terra que podem chamar “de meu”.
Chorosos, com mãos vazias, levam saudades e certeza de que o sonho acabou antes de ser iniciado, acenando para pessoas tristes pela partida, com os sonhos desfeitos transportados dentro dos motores regionais.
Na escuridão das noites, as luzes derradeiras da cidade grande ainda clareiam o barco regional que vai deslizando com suavidade e sem afundar nos rios não balizados, tristes por transportarem pessoas tristes também.
Um sonho acabou; mas, outro poderá começar no próximo porto!
Oi carlos,
ResponderExcluirVoce já está descrevendo os cenários que em breve estarei passando nesta viagem que eu tinha um grande sonho de realizar. Em maio estarei percorrendo o trecho Manaus Belem com mais um amigo de São paulo.
Poder conhecer voce pessoalmente tambem está nos planos desta viagem e já estou lhe preparando um presente para selar mais ainda esta nossa preciosa amizade. me aguarde. Tá chegando a hora.
Grande abraço para voce e sua familia.
Belo e sensível a tua crônica. Reunindo algumas como essa sobre o Amazonas, teríamos um excelente livro. Parabéns!
ResponderExcluirOi Carlos, boa noite.
ResponderExcluirEste roteiro pelo Solimões e Negro é um sonho pras muitos mineiros.
Lógico um sonho pra ser realizado de férias e não com a frustração descrita por ti de quem deixa pra trás Manaus como uma ilusão.
Um abraço
Esses sao os barcos que,meu esposo ama no Amazonas,e o sonho nao deve acabar nunca.O que mais sonho nesses barcos é com energia solar,e vaso sanitario,igual de aviao a vacuo.sempre fotografo esses vasos nos barcos,pra mim nao é ilusao e sim uma grande realidade.estou cansada de comer peixes,alimentados pelos nossos,adubos.
ResponderExcluirOs sonhos tendem a não desaparecerem eternamente
ResponderExcluirSempre surgirão novos sonhos e metas para quem supera a aparente derrota.
lindo
ResponderExcluirTristemente linda e verdadeira sua crônica.
ResponderExcluirMeus aplausos!!!!!!
ResponderExcluirBelíssima e realista crônica amazônica.
Meu nobre irmão Carlos Costa. Boa tarde!
ResponderExcluir.
Pena que teus escritos não são entendidos por tantos quantos os leem. Para parte de teus leitores, o significado intrínseco do teu pensamento, não é alcançado. Ainda assim, vale muito poder saborear as entrelinhas dos teus escritos. Parabéns! Continue assim. Deixe o pensamento livre para lhe inspirar nessa produção literária e nessa profusão de lembranças que uma vez ordenadas, se transformam em belíssimas páginas. E dentro das redes, quantas vidas, quantos sonhos sonhados ou vividos e aí, já não importa em qual porto, se de chegada ou de partida, pois a vida é sempre um recomeço.
Fica com DEUS e com os pássaros que espero, ainda te visitem em tuas janelas (inclusive as da vida).
Com um tríplice e fraternal abraço.
Os sonhos não morrem. Abraço, Carlos
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