Depois daquele morro que se avista à frente, cercado de verde por todos os lados, e que ao fundo possui um lago tranqüilo, existe uma cidadezinha, construída há muitos anos, que insiste em permanecer no mapa. Dela, hoje, poucos se recordam com precisão e são raros os que dela sabem o nome – Esperança.. Esse nome tem uma origem curiosa e ninguém afirma ao certo se o nome nasceu com a cidade ou se passou a existir desde que descobriram uma antiga moradora, talvez a última que insistia em permanecer lá.
Durante muitos anos aquela cidade viveu da esperança de um trem maria-fumaça que teimosamente passava por lá. Trazia notícias da cidade grande, gente curiosa também. Levava além do barulho ensurdecedor da fricção das rodas do trem com os trilhos e do apito estridente, lágrimas teimosas dos que ficavam. Também levava acenos de braços cansados, de mãos que abanavam, chapéus e de braços longos que seguravam lenços brancos.
Tudo era motivo de tristeza: a chegada de alguém e a partida de outrem. A chegada era triste. A partida era triste para os que ficavam. Os que chegavam da cidade grande se deparavam com uma cidade calma, pequena, onde o tempo não passava e onde as coisas pareciam querer se repetir.
Com a desativação da linha de trem,a cidade foi perdendo a razão de existir e as pessoas começaram a ir embora. A rua principal estava deserta, o cemitério estava abandonado e a igreja não abria mais. Era uma cidade quase deserta, não fosse a existência de uma única moradora que restavam em Esperança – se é que esse é o verdadeiro nome da cidade.
Na antiga estação, uma senhora de grande idade olhava todos os dias o relógio que marcava a chegada do trem. Curiosamente o relógio estava marcando onze horas, exatamente o horário da chegada e, talvez, a hora que marcou a sua última viagem.
- A senhora mora sozinha aqui? – perguntei, sem esperar uma resposta convincente.
- Não, eu não moro – respondi.
- Você também veio esperar o trem?
- Que trem?
- O trem que todos os dias vêm aqui me trazer notícias da cidade!
- Não há mais trem aqui. Ele deixou de vir aqui há muito tempo.
- Como não há mais trem aqui? Todos os dias eu o vejo chegar. Ele traz pessoas e leva pessoas daqui.
- A senhora espera alguém em especial?
- Sim. Eu espero a Esperança!
- Quem é Esperança?
- Esperança? Você não conhece a Esperança? De onde você veio que não conhece a Esperança?
- Desculpe-me, senhora, mas eu não sei quem é Esperança!
- Todos aqui conhecem a Esperança. É ela quem nos mantém vivos.
- Ela é médica do lugar?
- Ela é mais que a médica do lugar. Ela é a vida desse lugar. Se não fosse a Esperança nós não poderíamos viver!
- Afinal, senhora, quem é a Esperança?
- Ela é quem nos guia, mas faz acreditar no futuro, nos faz pensar em coisas melhores...
- Continuo não entendendo quem essa pessoa que a senhora espera tanto.
- Desculpe moço, mas agora tenho que ir...
- O que foi? O trem já chegou?
- Você não o viu? Ele passou e nem parou...
- Não parou por quê?
- Ora, moço, como você é estúpido. O trem não parou porque eu estava falando com você e, por alguns momentos, você me fez esquecer a Esperança...e é sempre assim. Se a gente esquece a Esperanças, as coisas passam em nossa vida e nós nem as sentimos.
A senhora virou-se costas, caminhou rápido e desapareceu naquela cidade que parecia fantasma.
E eu fiquei sem conhecer a Esperança, ou melhor, eu também perdi a Esperança!
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