Era um novembro de uma noite qualquer da década de 80. As comunicações entre a Mina do Pitinga, a 280 Km de Manaus explorada pela Mineração Taboca S/A, pertencente ao grupo Paranapanema, ainda se davam via rádio. De manhã, ao chegar para trabalhar, estava em cima de minha mesa uma comunicação inesperada: as barragens de decantação de minério de cassiterita do Pitinga se romperam. Na sexta-feira anterior ao fato, uma forte à chuva de dois dias seguidos caíra sobre a cidade, ultrapassando a cota de 10 anos de estudos geológicos para se construir barragens com certa folga. Todos os jovens com menos de 23/30 anos, talvez desconheçam esse fato, porque nenhum ainda era nascido e os de até 30 anos, tinham apenas 10 anos na época. Eu vivi isso!
Como assessor de comunicação e marketing da empresa, solicitei um avião e segui para ver a situação da perto e, visualmente, observei que havia sido um estrago grande, mas sem perda de vidas, vilas e isso considerei positivo. No máximo, poderia haver algum problema com os índios Atroaris/Waimiris, porque viviam de c e caça e pesca na reserva preservada Rio Alalaú. O Igarapé Madeira se ligava com o Rio Alalaú – que divide os estados do Amazonas e Roraima. Mas os rejeitos de minérios não o alcançaram porque a empresa agiu rápido na contenção. A Escola da vila do Pitinga Engenheiro José Galvão Fraga, continuava funcionando normalmente e recebendo alunos de funcionários que residiam 15 dias nas vilas de casas Pitinga e Jacutinga. Nada foi afetado na Mina. O Igarapé Madeira ficava em uma área baixa e as construções eram em uma área alta. Se alguém ficou sabendo do ocorrido, foram poucas pessoas do nível de staff como eram chamados todos os que possuíam nível superior na empresa. O nome da Escola foi em homenagem a um engenheiro que falecera de ataque cardíaco se deslocando de carro para Manaus pela estrada Manaus/Boa Vista, antes de barro e perigosa e hoje asfaltada durante o Governo de Amazonino Mendes, mas sem acostamento e ainda muito perigosa.
Sobrevoei a área das barragens rompidas, desci na pista de cascalho e laterítico do acampamento madeira, na Mina do Pitinga e me reuni com os geólogos da Mina, tendo à frente o Waltair Prata Carvalho. Depois de ouvir as explicações técnicas dos profissionais da área, retornei para o escritório da empresa na Avenida Ponta Grossa, no bairro Colônia Oliveira Machado. Trabalhava meio expediente na empresa e à tarde, exercia a função de Editor Geral do Diário do Amazonas. Sai da mina convencido de que seria só mais um problema a ser enfrentado e resolvido. No dia seguinte, a primeira matéria em um jornal da cidade fora publicada com certo estardalhaço. Li, avaliei e decidi que não deveria ser respondida. No outro dia, mais outra matéria e um telefonema de um assessor do Jornal que publicara a matéria com foto colorida na primeira página, dizendo que se a empresa não fizesse uma publicidade explicando o ocorrido, continuaria publicando matérias e especulando fatos. Decidi que enfrentaria o problema e orientei a empresa não pagar nenhuma matéria em nenhum jornal da cidade e fiquei sendo informado via rádio de tudo o que acontecia nas barragens.
A TV Manchete esteve na Mina do Pitinga para fazer reportagem, previamente autorizada pelo Samuel Hanam e Otávio Lacombe, quando o geólogo Waltair Prata Carvalho explicou em rede nacional os motivos do ocorrido, bem como os impactos gerados, tranquilizando a população. “Chovera dois (2) dias seguidos, continuamente, o que aumentou a vazão de todos os igarapés, que tiveram seus níveis de água elevados, provocando a flutuação de muitos troncos de árvores, que haviam nas margens das represas ou lagoas de operação, que acabaram indo parar nos vertedouros das barragens, obstruindo(reduzindo) suas capacidades de drenagem, elevando ainda mais o nível de água, que passou sobre o maciço da primeira barragem, erodindo-a em sua saia de jusante, provocando a liberação da água com lama, que foi estourando mais outras quatro barragens abaixo, no mesmo igarapé Madeira. Em uma semana retomamos a operação nestas áreas, já com todas as barragens recuperadas, e com sistema preventivo e ante obstrução por troncos, nos vertedouros.” explicou o geólogo.
De novo, outro telefonema ameaçando que se a empresa não publicasse matéria paga, o jornal diria que os restos de minério do Rio Pitinga poderiam comprometer o abastecimento de água do Rio Negro, em Manaus. Voltei à mina e reavaliei toda a extensão do Rio Pitinga, no recém-criado município de Presidente Figueiredo, resultado do desmembrando parte de Rio Preto da Eva e parte de Novo Ayrão, onde estão localizadas as maiores ilhas fluviais do mundo, as Anavilhanas. Observei que não haveria nenhuma possibilidade de alcançar a tomada de água na Ponta do Ismael, em Manaus, mas o alarde seria grande se o jornal publicasse essa informação. Decidi fazer uma nota explicativa sobre a queda das barragens e enviei ao jornal. Não foi publicada porque cobrariam pela publicação. Informado, fui contra, mas publiquei nos outros da época em Manaus: Diário do Amazonas, A Notícia e no Jornal do Comércio.
E por que estou escrevendo sobre isso, anos depois? Porque acompanho as questões da queda de barragem em Mariana, MG, causando vítimas fatais, destruição de casas e a morte de toda a vida de peixes ao longo da extensão do Rio Doce, que nasce em MG e termina em Santa Catarina. E também porque desejo revelar como funcionavam os jornais do passado em Manaus: sempre havia um dono e, ao seu lado, um assessor que falava em seu nome de seu dono para pedir dinheiro às empresas com problemas. Durante os mais de 4 anos em que fui assessor de comunicação e marketing da Mineração Taboca S/A, trabalhando diretamente com os empresários Octávio Lacombe (in memorian) e José Carlos Araújo, (in memórian), - chamado entre os funcionários de “Zé Milionário”, porque nunca era visto - orientava aos assessorados a não aceitarem esse tipo de “chantagem” indireta, em momento de dificuldades! Com o falecimento de seus fundadores, a empresa Mineração Taboca S/A foi vendida à Previ do Banco do Brasil. Há muitos anos só guardo no coração e na memória lembranças e saudades das vezes em que visitei as áreas do Pitinga e Jacutinga!
Ainda com iminencia de outras barragens se romperem, parece que as autoridades estao inertes para o presente caso. Eh um desastre imensuravel....
ResponderExcluirTANTAS COISAS ACONTECEM, O TEMPO PASSA, OUTROS ACONTECIMENTOS VÃOT TRAZENDO DE VOLTA AQUELE MEMÓRIA. TRAGÉDIAS AMBIENTAIS NOS ENTRSITECE, PORQUE AFETA VIDA NATURAL E DE MUITA GENTE. NEM TUDO VIRA NPTICIA, É MUITO MAIS COMPLICADA AS DIMENSÕES. NÃO HÁ COMO AVALIAR TODAS...APLAUSOS MIL PAZ E LUZ
ResponderExcluirCaro amigo Carlos Costa, boa tarde!
ResponderExcluirEmbora o ocorrido tenha semelhança ao ocorrido em Mariana, pois também apresentou o rompimento de barragens, a semelhança acaba por aí, já que no Projeto Pitinga as barragens, que romperam, apresentavam apenas 4 a 6 metros de altura, em seu ponto mais profundo, e continham areia e cascalho grosso do aluvião + lama (argila em suspensão na água), ou seja, eram reservatórios de água com elevado teor de turbidez, ou seja, com muita argila em suspensão, que deixavam a cor da água alaranjada, mas representavam resíduos inertes.
O volume de lama que desceu pelo Igarapé Madeira, afluente do Rio Alalaú, que passava pelas diversas aldeias indígenas, e é afluente do Rio Negro, era infinitamente inferior ao liberado nas barragens de Mariana, não tendo gerado morte de peixes, nem da flora aquática, nem impactou aldeia indígena ou comunidade, já que seu percurso ficou restrito às terras Waimiris/atroaris. O ponto, a partir do qual ocorreram os estouros das barragens, ficava a jusante da vila residencial do acampamento do Madeira, não possibilitando, ou gerando, nenhum risco ou ameaça aos residentes.
O impacto foi mais visual que ambiental. Os índios reclamaram, pois seus pontos de captação de água para beber ficou turvo, mas com 5 dias depois já estavam praticamente no mesmo padrão anterior.
Grande Waltair! A mineração deve muito a esse cara. Competente, sério e trabalhador. Muitos bate papos tivemos, juntos com o Altamiro da topografia, nas barracas de plástico, muito antes de virar uma Vila. Hoje vemos que aquele trabalho, sob sua coordenação, foi muito bem feito. O rompimento da barragem deu trabalho á todos, da segurança á assessoria de imprensa, á todos os funcionários da mina, mas sabíamos que o trabalho fora bem feito, e tínhamos convicção dos efeitos. Lembrar do Altamiro, do Cel. Dorneles, do Dr. Otávio, do seu Zé, do Carlos Costa, não esquecer o seu Domingos, o Lourival, o Alvair, o seu Clodomir, o Dr. Elmer, do Dr. César, da sua liderança, são alegrias que nos levam á um trabalho de alto nível. Você tem razão, nossas proporções eram muito menores e nosso trabalho muito melhor. Valeu Família Taboca!
ResponderExcluirOi Carlos, Como estamos vendo a questão dos rompimentos de barragens é antiga e distribuída por varias regiões. Aqui em Minas já tivemos exemplos anteriores, inclusive com vítimas fatais também, mas o fato é que o risco continuará sempre pois ainda se praticam técnicas de tratamento de rejeitos antigas - por questões de economia de processos , evidentemente - e enquanto isto ocorrer o numero de barragens vai só aumentando em nosso estado. Temos muitas comunidades inseridas em áreas das "calhas" das barragens , o que deveria ser previsto nos projetos minerários e as empresas mineradoras sabem bem disso mas não se importam em fazer uma previsão ou prevenção de tragédias, como aconteceu em Bento Rodrigues, onde nem sequer havia um alarme comunitário. Eu que conheci bem aquela localidade, posso avaliar bem o tamanho da tragédia, lembrando ainda que os riscos ainda não cessaram, pois existe uma barragem - maior do que as duas que se romperam - que está sob suspeita.
ResponderExcluirEntão, agora é só esperar pela próxima tragédia e rezar para que Deus nos ajude...
Em tempo> uma pequena correção, o Rio Doce, nasce em minas segue em direção leste e deságua em São Mateus no Espirito Santo, é um dos principais rios que nascem em nosso estado..
Grande abraço
OBRIGADO POR REVELAR
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