Maria Auxiliadora Costa, minha tia, pelos seus 70 anos de idade!
A música de Vanusa, “O Carteiro”, poderia definir essa crônica! Mas não define. Contudo, explica o desuso e a substituição das cartas pelos e-mails e outras redes sociais!
Correspondia-me muito, com muita gente, desde minha adolescência. A carta e o carteiro eram duas coisas que andavam sempre juntos. Sem o carteiro a carta também não chegaria! Não havia internet no final dos anos 70 e muito menos aparelhos de telefonia móvel. Só fixo e era caríssimo. O único meio de comunicação possível e com preço barato eram as cartas e eu as escrevia desde meus primeiros anos de Grupo Escolar Adalberto Vale. Ficava ansioso esperando a resposta do que havia escrito e postado, mas ao contrário do que diz a letra da música de Vanusa, não a esperava no “portão” e nem ficava parado com “a carta na mão”, porque sabia que não seria de “tristeza”, mas de “alegria” a resposta que receberia.
Os adolescentes que tinham dinheiro falavam ao telefone. Conversavam com suas namoradas. Demoravam longos minutos pedindo: “desliga”. “Não, desliga você” e decidiam os dois desligar ao mesmo tempo contando 1, 2, 3 e encerravam com promessas e juras de amor intermináveis, para o total desespero dos pais no final do mês ao receberem o valor da conta. Muitos contavam os minutos de ligação. Nessa época, sem dinheiro, vendendo jornais, picolés, cascalho ou velas e flores em porta de cemitério, mas estudando e querendo mudar de vida, mal conseguia dinheiro e me correspondia com minha tia Maria Auxiliadora Costa, no RJ, além de outras pessoas, como a Ana Monteiro, que trabalhava na Ceplac, que dentre outras atribuições, ajudava e orientava os plantadores de cacau, na Bahia e Sandra R. Henriques, na cidade paulista de Santos. De todas, esperava resposta de minhas cartas e me sentia feliz quando chegava. Geralmente, as cartas eram escritas quando trabalhava como auxiliar de escritório no Consórcio Manaus, depois consórcio União. Criativo quando não queria encerrar a longa carta, dizia que meu patrão Edson da Silva Massulo, já estava me chamando e escrevia “já vou Edson” e encerrava a correspondência. Eu faria aniversário no ano seguinte e quase nenhum dinheiro! Josefa Costa, minha mãe, me prometeu um bolo de presente. Haveria festa, com guaraná Luzéia, Magistral, Baré e Andradde, todos fabricados em Manaus e os melhores que existiam.
A tia Auxiliadora, já tinha sido informada por carta da promessa que a mãe me fizera e, telefonou o número que minha irmã Iraides Costa, trabalhando na empresa Imifarma, havia adquirido para nossa casa e falou comigo: “qual o presente que você quer receber”. Sem pensar, respondi “me traga um dicionário, se poder”. Depois, me escreveu e perguntou qual o tipo do dicionário que queria receber. Eu lá sabia que dicionário tinha tipo ou marca? Respondi: “sendo dicionário, qualquer um me servirá para mim porque o quero para estudar, apenas!”
No dia em que desceu do avião no Aeroporto Ajuricaba, em Manaus, estava esperando-a ansioso e quase entrei na pista indo buscá-la à porta do avião só para perguntar se ele havia trazido o presente. Meu pai segurou-me e não deixou que fosse à pista de pouso, recebê-la como gostaria. Desceu por uma longa escada que era colocada nos aviões DC3 que pousavam meio de bico para cima e uma rodinha pequena na parte de trás do avião, e vi um pacote em sua mão. Meu coração bateu forte.
- Trouxe meu presente?
- Sim, lhe entregarei em casa!
O coração bateu forte quase pula pela boca. Seria meu primeiro presente depois do cavalinho de couro que havia recebido de minha avó adotiva, dona Zizi, devido minhas boas notas nas Escolas, cujos cadernos conferia pessoalmente todos os dias. Do cavalinho de couro, gostei muito e mantive-o em meu poder por longos anos. Do meu primeiro dicionário, gostei muito mais ainda porque me serviria para estudar. Desembrulhei o presente e era um de capa preta, dura, autografado por minha tia, em letra de forma! Mas, como? Ela não era a autora da obra? O guardei e usei por longos anos. Com as constantes mudanças na língua portuguesa, ficou defasado e perdeu sua utilidade, mas não sua importância. Por que a língua portuguesa muda tanto? As gramáticas também mudaram e tudo o que era no passado, hoje não é mais. Infelizmente. Nunca fui muito bom em gramática. Até os 17 anos, não sabia diferenciar o “mas” proposição de “mais”, como quantidade. Até hoje sou grato à professora de inglês Alice Fabrício da Silva, do colégio Dorval Porto, por ter corrigido o livro “(DES)Construção...,(1978/Imprensa Oficial, Mao-Am, 1a Edição, 2a – Prefeitura Municipal de Manaus, “Coleção Valores da Terra”/2001) a primeira obra poética lançada em 1978, aos 18 anos, quando dava meus primeiros passos no jornalismo e me tornei professor de gramática e língua portuguesa. Mas meu primeiro dicionário me serviu por longos anos e foi meu maior e melhor presente até hoje porque a partir dele, comecei a me interessar mais pela escrita, fiz jornalismo, me tornei escritor e devo muito ao meu primeiro dicionário, embora a escrita continue igual, a gramática está ficando cada vez mais difícil em suas regras
Carlos Costa, receber presentes sem significados e às vezes sem importância não é muito bom, ficam jogados de lado. Parabéns para a Maria Auxiliadora Costa que fez a diferença na sua vida com um belo dicionário! E felicitações pelos 70 anos dela e poder ver a sua trajetória de sucesso na vida!
ResponderExcluirAh, que saudade das cartas! Bom relembrar. Parabéns pela crônica! Abraços!
Sonia Salim