quinta-feira, 17 de maio de 2012

"AS CHATAS DE RODAS"


Muita fumaça negra saindo por uma chaminé longa, no alto de um toldo; um monte de madeira para alimentar a caldeira com homens, provavelmente suados, usando blusas sem mangas, alimentando-as para produzir o vapor necessário e fazer girar as rodas nas laterais ou aos fundos das embarcações.  Esses eram sinais de que uma “chata de roda” passaria pela comunidade de Varre-Vento e a meninada  descia à margem do rio Solimões para apreciá-las.

Eram lentas, expeliam fumaça que, de longe, se podia avistar, os “barcos à vapor” ou simplesmente  “chatas de rodas” como eram conhecidas essas embarcações, que consumiam muita madeira.  A lenha era o alimento da caldeira que as impulsionava para frente, mas eu pensava: será que também as impulsionavam em marcha ré? Nunca saberei; não naveguei em uma “chata de rodas”.

Cheguei a admirá-las navegando pelo Rio Solimões, no Amazonas. Não sei de onde vinham e nem para aonde se destinavam, também não tinha consciência ecológica da grande quantidade de madeira que consumiam para se deslocar. Mas imagino que eram necessárias algumas toneladas!

Mas que era uma maravilha vê-las navegando de forma lenta, preguiçosa, singrando os rios, isso era sim! Era como se nem saíssem do lugar, de tão lentas que navegavam, deixando um rastro de fumaça negra por onde passavam!

Como afirmei, embora nunca tenha entrado em uma dessas “chatas de rodas” fui testemunha visual de que quase não produziam banzeiro, tamanho à lentidão em que trafegavam. Mesmo não tenho viajado em uma, minha imaginação ganhava asas ao tempo em que criava a idéia de que o barco só funcionava  em face das pessoas suadas, roupas rasgadas nas mangas, que alimentavam de madeira as caldeiras que produziriam o vapor necessário a impulsioná-las pelos rios.

Ah, como viajava só imaginando-as em minhas memórias infantis e sonhadoras de alguém irrequieto e incomodado com o estado de pobreza da família!

As “chatas de rodas” conduziam passageiros e cargas; as poucas que testemunhei navegando, do barranco, me faziam sonhar: pensava que o barco possuía em sua parte inferior, em algum lugar qualquer, um espaço só para guardar toras de madeiras, combustível necessário para que navegassem suavemente dentro de minha mente, deslizando em meu coração e permanecendo gravada na memória!