A Yara Queiroz, advogada
No café da manhã, minha esposa Yara Queiroz, depois de dizer que “hoje dia de São João” e começou a cantar a estrofe da música “Brincadeira na Fogueira” composição de Antônio Barros e gravada inicialmente pelo Trio Nordestino e regravada por vários outros cantores - “tem tanta fogueira tem tanto balão/tem tanta brincadeira/todo mundo no terreiro faz adivinhação/Meu São João eu não/Eu não tenho alegria...” .Mais tarde, postou um texto no facebook falando de suas lembranças de quando sua família morava na Vila Rezende, no bairro de Aparecida e seu pai advogado, exímio tribuno e também deputado estadual pelo MDB na época do bipartidarismo, Francisco Guedes de Queiroz, contratava o Boi “Corre-Campo” para se apresentar aos moradores da Vila, na Rua Alexandre Amorim. Era uma farra e um medo só!
Depois que deixei a academia do Residencial Mundi Resort, minha esposa Yara Queiroz entrou em contato telefônico e me pediu que lesse uma postagem que tinha feito no facebook sobre seu saudosismo. Li, gostei e compartilhei porque recordou de seu pai advogado, Francisco Guedes de Queiroz, mesmo já sendo deputado, ainda morava de aluguel na Vila Rezende. Ele contratava o “boi bumbá” Corre-Campo, um dos mais antigos e tradicionais de Manaus, para se apresentar aos moradores da Vila. Na brincadeira de quadrilha que acontecia no Colégio Aparecida, sua mãe Maria Luíza de Souza Queiroz a arrumava toda e ela seguia para apresentações, na companhia de sua irmã Amanda Queiroz. Maria Luíza, dia 21 ela completaria 79 anos. Faleceu dia 2 de agosto de 2004, na casa adquirida por seu esposo deputado estadual do MDB por 26 anos. Da Vila Rezende para o Conjunto Uirapuru, foi uma mudança traumática para todos. A casa nova fora adquirida em 1975, dezessete anos depois de seguidos mandatos parlamentares, pela oposição. Sua honestidade e seu trabalho como oposicionistas e a fama de grande orador ainda hoje são reconhecidos como sua marca registrada até hoje pelos parlamentares mais novos.
Também lembrei ter visto assustado e com medo nos olhos, vaqueiros com lança nas mãos e chapéus cheios de espelhos na cabeça, entrando pela Avenida Adalberto Vale, em algazarra e latido de cachorros, para procurarem os Bois Brilhante, Corre-Campo e Malhadinho, que teimavam em “fugir e esconder” nas matas ainda existentes no Bairro da Betânia. Por que será que sempre escolhiam as matas do bairro da Betânia e os buritizais do hoje bairro do Jappim ? Os vaqueiros diziam que procurariam os bois porque teriam que matá-los e entregar as línguas aos seus donos, cumprindo ordens de sua filha Catirina que estaria grávida e manifestara o desejo de comê-la! Será que o fazendeiro não teria outros bois e teria que ser exatamente o boi fujão? Será que os “fazendeiros” tinham três filhas chamadas Catirinas e todas teriam ficado grávidas ao mesmo tempo? Seria verdade e seria possível essa incrível coincidência? Quem sabe, o pai dos filhos das três Catirinas fosse até o mesmo! A imaginação de menino assustado faz cada pergunta boba. Mas eu queria saber!
Só sei que era alegre vê-los em suas roupas coloridas e diferentes, entrando nas matas para buscá-los. De igual, só mesmo os chapéus com os espelhos e as lanças em suas mãos. Será que matariam o boi usando apenas as lanças? Não sei dizer também. Depois que encontravam o boi, voltavam em nova algazarra, com o boi cheio de mato nos seus chifres! Ficava só olhando entrar nas matas e sair dela depois, com o boi completamente solto. Por que não o teriam laçado ou não o teriam matado e cortado sua língua, apenas? Tinham que levá-lo para sacrificá-lo na fazenda?, Ficava meio assustado e sem entender nada porque quando foram procurar o boi, diziam que cortariam sua língua depois de capturá-lo. Será que o matariam primeiro, ou cortariam sua língua ainda vivo? Nada disso! O boi fujão estava no meio deles, muito tranquilo. Será que sabia que morreria e sua língua lhe seria arrancada? Acho que não! Gostava da algazarra e todos dizendo que cortariam sua língua para entregá-la ao dono da fazenda. Como minha esposa Yara Queiroz, também pensava que tudo era verdade!
Anos depois, o jornalista Bianor Garcia, decidiu criar o Festival Folclórico de Manaus para que todas as manifestações culturais se apresentassem em um único local único e continuar mantendo tradições culturais. Também se apresentavam no Campo do General Osório, do hoje Colégio Militar de Manaus, os bois Corre-Campo, Brilhante, Malhadinho e outros, no campo, próximo ao Colégio Dom Bosco, hoje Faculdade Dom Bosco. Yara Queiroz, em seu escrito, lembrou que o boi balançava a cabeça na tentativa de receber um afago. Ela sentia medo porque pensava ser real o “Corre-Campo” e subia as escadas na Casa 14 da Vila Rezende, chorava e ficava pensando que seria atacada pelo boi “da cara preta”. “Boi, boi, boi da cara preta, pega essa menina que tem medo de careta”, era uma música cantada pelas mães, para meter medo nas crianças. Com o tempo, minha esposa, a advogada e assessora jurídica da ALE/Am, Yara Queiroz passou a aceitar, conhecer e comemorar com os vaqueiros, a catirina, o caçador e os índios nas casas vizinhas e brincavam com danças e cânticos alegres ao redor da fogueira.
Hoje, infelizmente, o progresso cobriu de asfalto as florestas, jogou água e apagou a fogueira de São João, destruindo os fogos de artifícios que anunciavam as apresentações e matou a alegria de brincar coletivamente. Hoje, tudo é cibernético, por mensagens, e-mails, skype, whatsapp, facebook, tudo pelas péssimas e caras redes de internet que comercializam ao povo!
É a nossa realidade, caro mestre!
ResponderExcluirRealmente as tradições estão se perdendo com o tempo!!
ResponderExcluirMuito bom, Carlos,
ResponderExcluirCaríssimo Carlos Costa, aqui onde estou (Estamos todos no Nordeste do Brasil), todos os dias do mês de Junho, é possivel ver e admirar os festejos JUNINOS. Tudo igualzinho a sua cronica, com deputados, e outras classes ... Aqui é Brasil de verdade, pois somos todos povo., gente, solidariedade em tudo. Abraços
ResponderExcluirLindo poema. Parabéns.
ResponderExcluirfez recordar idênticos na minha infância em Belém do Pará...que no mês de junho fervia de festividades e emoções...e apresentações dos bois Malhadinho,Mimoso, Brilhante e de Pássaros...como o Uirapuru e vinha uma quadrilha de São João...com suas músicas, danças típicas e guloseimas. Em cada bairro as populações cercavam os quarteirões e faziam-se grandes balões e fogueiras...soltavam-se balões e enfeitavam e enfeitavam de bandeirinhas e bandeirolas multicoloridas...Todos nós, embora pobres, sonhávamos com as Festas de Santo Antônio, São Pedro, São João e São Marçal, com Ç mesmo kkkk, onde se festejava queimando paneiros. Não sinto e nem saudades da pobreza e miséria...mas sinto saudades e uma nostalgia me invade o coração com um forte sentimento de lembrança de que éramos e sabíamos disso, mas não imaginávamos o tempo e o vento mudariam isso, que reunia as pessoas, tornando-as mais humanas e felizes. Parabenizo sua esposa Yara, por ter escrito suas lembranças. Há tempos eu gostaria de ter escrito de modo igual. Um abraço,
ResponderExcluirNuma cidade grande como o Rio de Janeiro, o São João não existe. Os cariocas tornaram-se um povo sem identidade. As escolas pouco exploram o folclore e assim gerações vão se formando sem referencias históricas. Você falou muito bem, a fogueira se apagou e com ela, a alegria, e arte de brincar coletivamente. Bonito texto. Obrigada.
ResponderExcluir