A noite acordou.
Também acordei coberto por
uma claridade abafada que anunciava o dia e decidi acompanhar minha esposa Yara
à Feira, porque os “poetas da madrugada estavam para chegar”. Enfrentei os mesmos
problemas de sempre - falta de local para estacionar na área, cuja solução será
resolvida só quando o Porto de Manaus de embarque de cargas e passageiros de
barcos regionais for transferido para o porto da Ceasa, sem atrapalhar o
trânsito, ideia defendida há muitos anos pelo ex-prefeito Manoel Ribeiro,
retirado do cargo por intervenção decretada pelo ex-governador Amazonino Mendes.
Caso contrário, será mais uma batalha perdida pela Prefeitura de Manaus.
Mas isso é para as
autoridades resolverem; não para um cronista que espera ansiosamente seus “poetas
da madrugada” para um almoço. O tempo passava e nenhum chegava! Todos
começaram a chegar depois das 12 horas. Mas para mim, que já os esperava desde
às 11 horas da manhã, todos estavam demorando muito, fazendo aumentar meu
nervosismo. Flávio Queiroz chegou primeiro, carregando sua geleira; Marcelino
Ribeiro telefonou informando que chegaria antes de uma hora da tarde e cumpriu
a promessa, chegando com sua cabeça raspada, banjo, violão e seu atabaque. O
pintor Moacir Andrade, chegou logo depois carregando o corpo elegante, mas
diabético, do alto dos seus 85 anos de vida. Chegaram juntos, Moacir ladeado
com o poeta sexagenário José Coelho Maciel e também membro do Clube da
Madrugada, desde 1966. Estava quase completo, mas faltava o principal
convidado, o poeta Jorge Tufic!
Eu e minha esposa Yara,
compramos um tambaqui de rio, grande, gordo e mais gostoso do que os de viveiro
que, embora tenham melhorado muito em sua qualidade e sabor, continuam
sendo “assassinados” com um pouco mais
de 2 kilos para não dar prejuízo aos criadores com alimentos, mas ainda não
pode ser comparado ao autêntico tambaqui de rio, sempre mais gostoso e
consistente. Até mesmo os tambaquis de rio já não têm tamanhos imensos como os
que meu pai pescava no Varre-Vento, com peso variando de até 30 ou 40 quilos;
parece que também estão sendo pescados de forma indiscriminada e nem têm tempo
de cresce!
Voltei para casa com dois
tambaquis e comecei a escrever essa crônica, mas não me cabendo dentro de meu
desejo de reencontrar pessoas queridas como o poeta Jorge Tufic, um dos
fundadores do Clube da Madrugada, a quem havia conhecido na década de 80,
durante um programa de entrevistas ao vivo apresentado na TV Amazonas, por
Consuelo Nunes, que depois me fez enfrentá-lo em uma disputa do “Melhor
Escritor do Ano”, juntamente com o também escritor Danilo Du Silvan que
denunciara, mas não provara qualquer fraude.
Como eu poderia ganhar de
meu ídolo? Nem queria!
Telefonamos – eu e o poeta,
pintor e livre pensador Maciel - muitas vezes para o hotel em que Jorge Tufic
se encontrava hospedado, afinal, todos estavam na Área da Churrasqueira do
Condomínio Mundi para vê-lo e abraçá-lo - José Coelho Maciel, Marcelino Ribeiro
e Flávio Queiroz e Moacir Andrade. Durante a conversa alegre e desorganizada,
antes da chegada do poeta Jorge Tufic, eu fiquei sabendo que o pintor Moacir
Andrade também tinha sido um dos fundadores do Clube da Madrugada. Depois,
chegaram mais convidados, porém um de cada vez!
O nervosismo estava
aumentando e aquele que todos esperavam - o consagrado poeta Jorge Tufic -
informava por telefone que estava resolvendo “uns” problemas de transferência
de hotel. Depois, se deslocaria ao local do encontro com seu filho “Jorginho”.
Chegou depois das 16 horas e foi aplaudido por todos. Antonino Bacelar, poeta,
médico e professor aposentado da Fundação Universidade do Amazonas, ainda não
havia chegado. Compareceu a tempo de conversar ao pé do ouvido com Jorge Tufic..
Disse depois que só estava pedindo o endereço do poeta para visitá-lo quando
fosse à Fortaleza.
Marcelino informava que “já
me considero um amazonense” sempre respondendo em versos, quando todos
o questionavam sua origem paraibana. O poeta também cantou músicas do
compositor/cantor da Ilha Tupinambarana Chico da Silva e até tentou interpretar
algumas com minha enteada, a cantora Bella Queiroz, depois que entoou sua
música preferida “hoje só voltarei amanhã porque vou beber...” sempre improvisando
um final diferente para a mesma música, fazendo sempre um verso de improviso sobre
o dono da festa. Todos se divertiam e conversavam em volume elevado, até que
Marcelino, dizendo que teria outro compromisso decidiu levantar-se com sua
esposa Susan e sair, mas o principal poeta esperado estava demorando muito.
Jorge Tufic, chegou ao local por volta de 16:40 horas, também carregando seus
mais de 80 anos, acompanhado pelo filho “Jorginho”. Todos os cumprimentaram
inclusive minha esposa Yara. Deixe-lhe um abraço forte e o Jorge Tufic sempre
levando um lenço ao seu vasto bigode negro e depois o levava aos olhos, como se
estivesse emocionado.
Fiquei tenso porque
estava recebendo o criador do movimento “Poesia no Muro” uma influência do
movimento “Poesia Concreta”, defendido na Semana de Arte Moderna, em SP,
de 1922, que chegara tardiamente à capital do Amazonas, cidade isolada e sem
muitos meios de comunicação, com telefone funcionando só através da inexistente
Camtel – Companhia Amazonense de Telecomunicações. O clube dos “cavaleiros
de todas as madrugadas”, como costuma dizer Jorge Tufic, foi fundado na
madrugada do dia 22 de novembro de 1954, com outros amigos intelectuais que
viviam isolados do mundo. O Clube da Madrugada nunca teve uma sede própria: “seus
escritores sempre se reuniram embaixo de um “mulateiro”, na Praça Heliodoro
Balbi”, afirma o contista Adriano Aragão. Também não possui estatuto
escrito porque os membros como eu e o médico Simão Pecher, empossados na década
de 80, pelo ex-presidente do Clube, padre Nonato Pinheiro prosseguem com a tradição:
“onde
estiver um ou mais escritores reunidos falando de cultura, lá estará também se
reunindo o Clube da Madrugada”. Garante também Adriano Aragão: “o
Clube da Madrugada é reconhecido não apenas no Brasil, mas em várias partes do
mundo”. É...o escritor tem razão!
Foram os mais
importantes fundadores do Clube da Madrugada ao amanhecer daquela madrugada os
jovens intelectuais idealistas Celso Melo, Farias de Carvalho, Fernando Colyer,
Francisca Ferreira Batista, Humberto Paiva, João Bosco Araújo, José Pereira
Trindade, Luiz Bacellar, Saul Benchimol, Tedodoro Botinelly, Jorge Tufic e
Moacir Andrade, e alguns hoje já falecidos; outros corroídos e envelhecidos pelo
tempo, mas sempre deixando novas gerações como eu e outros que ainda virão,
para continuar o legado histórico!
Pelo Skype, informei
ao Jorge Tufic que havia conversado com a poetisa Tarciana Portela, lançada ao Brasil inteiro por ele, através de 3
mil exemplares do LIVRORNAL, distribuído
de graça pelo poeta, direto de Recife. Tarciana Portela se apresentava com a
mais nova promessa da poesia do Amazonas, mas sem nenhum livro, ainda. “Tarciana,
você uma promessa e eu tenho mais a perder do que você porque perderei minha
credibilidade se você não for um fenômeno literário”, disse-me Jorge
Tufic. Quando falei que a poetisa estava morando em Recife e me disse: “pensei que ela ainda estava residindo em
Manaus”, disse-me seu “descobridor”.
Poetas, escritores
de qualquer estilo ou preferência e cronistas não se descobrem; eles já nascem
prontos e são lapidados pelo tempo!
A pesquisadores da
obra musical de Pedro Amorim – não sei se o homenageado pertenceu também ao
Clube da Madrugada - de quem receberá o resultado de sua pesquisa de mestrado, com
quem tive o prazer de conviver durante o tempo em que ele dirigiu o Teatro
Amazonas e eu era um jovem aspirante a ator de teatro, na trupe do teatrólogo
Álvaro Braga. À Karine Aguiar, também cantora, que me presenteou com seu CD “Arraial
do Mundo”, conversou informalmente com o pintor Moacir Andrade, que lhe
contou muitas histórias conhecidas e vividas por ele, sobre seu homenageado.
Mas saiu antes da chegada do poeta Jorge Tufic – para mim era uma espécie de Deus da cultura, um
mito! – não sei nem se isso existe - de
quem já tinha lido livros e escutado
comentários elogiosos. Nosso primeiro encontro se deu no Estúdio da TV Amazonas,
durante a apresentação do programa de entrevistas apresentado por Consuelo
Nunes - eu divulgando meu primeiro e único livro de poesias,(DES)Construção....(1978)
lançado com sucesso no salão de espelhos do Atlético Rio Negro Clube e Tufic, comentando
um de seus mais de 50 livros já lançados.
De Moacir, durante a
conversa alegre e informal, tivemos a informação de suas viagens e exposições
no exterior e o seu conhecimento com as celebridades de Manaus e do mundo.
Um dia todos eles saberão
que vivi uma tarde das mais felizes dos últimos tempos! Mas outros poderão
acontecer, talvez, porque o amanhã só a Deus é dado conhecer!
Parabéns pelo excelente trabalho escritor. Estou amando ler seus textos.
ResponderExcluirOla, carlos,
ResponderExcluirQuem é querido tem amigos e vc e um deles.Respeito e aprendo muito com suas cronicas.
Beijao
Maria Hirschi
CH
Foi meu Professor no CMM. Uma figura ímpar. Descanse em Paz Professor Moacir
ResponderExcluirGrande Moarcyr Andrade!
ResponderExcluirQue Deus o tenha em boa morada e dê um bom conforto pra familiares e amigos.
O desaparecimento de Moacir de Andrade deixa uma lacuna na cultura do Amazonas.
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