domingo, 10 de março de 2013

A MORENA E A FLOR


 
De mais importante que havia na cidade depois do prédio de vinte andares construído na avenida principal, que abrigava a maioria dos escritórios e consultórios executivos, era a morena Mariana, que desfilava a graça de seus poucos anos em frente ao Hotel que eu morava. Jamais perguntei sua idade, muito menos o que fazia ali, me provocando, dia e noite, noite e dia. De certo que eu sabia, mas fazia que não quisesse entender.
 
Na realidade, para as pessoas do lugar a linda morena pouco ou quase nada representava. Ela não estava nos cartões postais como estava o prédio de vinte andares, construído por algum louco construtor e projetado por um engenheiro que não entendia nada do que era belo. Ele simplesmente projetou o prédio de forma tal eu o mais belo – uma pequena rosa que nascia no asfalto, bem a sua frente, não podia ser vista.
 
No dia que encontrei aquela teimosa rosa querendo existir entre os restos do material de construção deixados pela inoperância – talvez, da prefeitura ou a irresponsabilidade da construtora que construiu o prédio, sorri de alegria e esqueci, por longos momentos, a intrigante e desfilante Mariana. Como uma rosa poderia existir entre restos de um prédio de vinte andares?
 
Durante vários dias, como que imitando as pessoas do lugar, caminhei pela rua principal e parei em frente ao prédio. Mas, ao contrário os moradores da cidade, eu não olhava a beleza da arquitetura, não subia em um dos quatro elevadores do prédio e nem ficava olhando a cidade do terraço, com a sensação de que estivesse dentro de um avião. Não. Eu somente olhava a minha rosa. Tinha-a adotado para mim, no exato momento em que a vi pela primeira vez e, com ela, estabeleci uma relação de amizade.
 
De noite, costumava passar por lá, só para vê-la; como se vê diariamente uma namorada. Minha preocupação era com o crescimento que era enorme e todos os dias eu me sentia mais feliz com o descaso da prefeitura do lugar para com o lixo acumulado nas ruas, motivo de protestos do único jornal existente e de pronunciamentos violentos dos vereadores. Eu era o único – ao que parece, a apoiar plenamente a falta de iniciativa do prefeito. Enquanto ele nada fizesse para retirar o lixo, minha rosa continuaria existindo.
 
Depois da rosa, minha companheira constante, somente a morena Mariana me interessava. Ela teimava em desfilar em frente ao meu hotel, ora sozinha, ora com um noivo, um cara que não tinha nada de simpático e que não entendia nada de flores. De vez em quando, chegava a pensar que Mariana sabia de meu namoro com a rosa, por isso, tentava-me. Talvez fosse verdade. Eu até comparava minha rosa com a morena Mariana. Uma teimosamente buscava a luz do sol, entre os restos de material de construção, escondida para existir; a outra buscava a mim, entre as calçadas de meu hotel, às claras. Era só isso.
 
Minha rotina na cidade continuou por mais alguns dias, até que acordei pela manhã chocado com a notícia que li no jornal. O prefeito, aborrecido com tantas críticas, decidiu retirar o lixo da cidade. Foi um desespero para mim e uma alegria geral para todos. Como se fosse ecologista que nunca fui, corri rua à baixo e parei em frente ao prédio de vinte andares. Era tarde demais. Minha rosa tinha sido assassinada e só eu sabia disso. Foi triste, muito triste perder minha amiga, de uma forma trágica.
 
Mais trágico ainda foi voltar ao hotel e encontrar na portaria um convite para o casamento da morena Mariana, naquele mesmo dia.
Não fiquei mais na cidade. Não havia motivos!
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário