Cobria-me dos pés a cabeça
e sentia frio dentro de minha rede preguiçosamente esticada em um corredor de
nossa casa de madeira no bairro da Betânia, sempre que assistia a qualquer
filme que exibisse cenas de chuva, relâmpago e vento. Também sentia minha vida tranquila
e despreocupada de adolescente voltando a ser livre, leve e solta na comunidade
de “Varre-Vento” e eu, correndo pelo mato, tomando banho de chuva, apanhando
água em cuia, sentindo frio, me abrigando embaixo de folhas grandes de bananeira quando a chuva era muito intensa.
Em meus delírios infantis de
menino sonhador, imaginava que a chuva entraria em meu corpo, me banharia de
alegria ou tristeza. Achava que estava
me protegendo de um futuro incerto, todo embrulhado, mesmo com imenso calor que
sempre fazia em Manaus, em uma casa que nem ventilador tinha para mim porque
minha família era pobre e não podia se dar a esses “luxos bobos”.
Acho que o meu frio era
psicológico. Mas isso sempre acontecia comigo quando assistia aos filmes só
passavam no horário da noite. Mas aproveitava para dormir também. Era gostoso
dormir ouvindo o barulho da chuva batendo nas folhas comuns nos filmes ou no
zinco de nossa casa quando chovia mesmo e eu fazia o mesmo!
Em filmes de Tarzan,
correndo no meio da selva com a chuva caindo, gostava de assistir porque o barulho
da água nas folhas me davam uma alegria muito grande e lembrava quando morei em
casa coberta de palha e alumínio....era gostoso e prazeroso! Coberto como
ficava nessas horas, imaginava, que a chuva não me alcançaria e não sentiria o
frio que pensava sentir na hora em que tempo ruim estava se formando. Se
estivesse dentro de um cinema, somente cruzava os braços para não sentir o frio
e disfarçava o que realmente estava sentindo. Ninguém percebia, mesmo que me
olhasse várias vezes com o rabo do olho. Sentia frio, fosse que filme fosse,
bastava cair os primeiros pingos de chuva nas folhas das árvores ou na terra
mesmo!
Como residi no interior do
Amazonas por algum tempo, gostava de chuva – o que era comum. Depois do dilúvio
de Deus em forma de lágrimas tristes que
encharcavam folhas, como se fosse um protesto do Criador contra a destruição de
sua riqueza natural ou contra os homens que destroem o que é belo, sentia o
frescor das folhas com o cheiro característico de terra molhada. Isso me bastava
e causava em mim uma imensa alegria. Era agradável o barulho da chuva caindo
sobre as palhas que cobriam nossa casa!
Corria pela mata molhada,
mesmo descalço, banhava-me em biqueiras improvisadas ou abrigando-me embaixo de
frondosas folhas de algumas árvores. Era gostoso demais! Minha mãe sempre
brigava e gritava “menino, sai da chuva, você vai pegar gripe!”. Eu nem ligava!
Minha alegria de menino era maior que o medo de ficar doente, gripado, com
febre porque estava só cumprimentando com meu gesto inocente; uma coisa bela
que Deus me enviava, em forma de chuva na floresta. Por isso, acho que também
sentia frio quando assistia aos filmes em que tivessem chuva!
Mas não sei...
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