terça-feira, 26 de março de 2013

EU, A CHUVA E O FRIO





Cobria-me dos pés a cabeça e sentia frio dentro de minha rede preguiçosamente esticada em um corredor de nossa casa de madeira no bairro da Betânia, sempre que assistia a qualquer filme que exibisse cenas de chuva, relâmpago e vento. Também sentia minha vida tranquila e despreocupada de adolescente voltando a ser livre, leve e solta na comunidade de “Varre-Vento” e eu, correndo pelo mato, tomando banho de chuva, apanhando água em cuia, sentindo frio, me abrigando embaixo de folhas grandes de  bananeira quando a chuva era muito intensa.

Em meus delírios infantis de menino sonhador, imaginava que a chuva entraria em meu corpo, me banharia de alegria ou tristeza.  Achava que estava me protegendo de um futuro incerto, todo embrulhado, mesmo com imenso calor que sempre fazia em Manaus, em uma casa que nem ventilador tinha para mim porque minha família era pobre e não podia se dar a esses “luxos bobos”.

Acho que o meu frio era psicológico. Mas isso sempre acontecia comigo quando assistia aos filmes só passavam no horário da noite. Mas aproveitava para dormir também. Era gostoso dormir ouvindo o barulho da chuva batendo nas folhas comuns nos filmes ou no zinco de nossa casa quando chovia mesmo e eu fazia o mesmo!

Em filmes de Tarzan, correndo no meio da selva com a chuva caindo, gostava de assistir porque o barulho da água nas folhas me davam uma alegria muito grande e lembrava quando morei em casa coberta de palha e alumínio....era gostoso e prazeroso! Coberto como ficava nessas horas, imaginava, que a chuva não me alcançaria e não sentiria o frio que pensava sentir na hora em que tempo ruim estava se formando. Se estivesse dentro de um cinema, somente cruzava os braços para não sentir o frio e disfarçava o que realmente estava sentindo. Ninguém percebia, mesmo que me olhasse várias vezes com o rabo do olho. Sentia frio, fosse que filme fosse, bastava cair os primeiros pingos de chuva nas folhas das árvores ou na terra mesmo!

Como residi no interior do Amazonas por algum tempo, gostava de chuva – o que era comum. Depois do dilúvio de Deus em forma de  lágrimas tristes que encharcavam folhas, como se fosse um protesto do Criador contra a destruição de sua riqueza natural ou contra os homens que destroem o que é belo, sentia o frescor das folhas com o cheiro característico de terra molhada. Isso me bastava e causava em mim uma imensa alegria. Era agradável o barulho da chuva caindo sobre as palhas que cobriam nossa casa!

Corria pela mata molhada, mesmo descalço, banhava-me em biqueiras improvisadas ou abrigando-me embaixo de frondosas folhas de algumas árvores. Era gostoso demais! Minha mãe sempre brigava e gritava “menino, sai da chuva, você vai pegar gripe!”. Eu nem ligava! Minha alegria de menino era maior que o medo de ficar doente, gripado, com febre porque estava só cumprimentando com meu gesto inocente; uma coisa bela que Deus me enviava, em forma de chuva na floresta. Por isso, acho que também sentia frio quando assistia aos filmes em que tivessem chuva!

Mas não sei...

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