Não me causou qualquer surpresa o resultado do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, decidindo que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada mesmo que a mulher agredida não denuncie ao agressor. Será a aplicação, com esse entendimento, não poderia ter evitado a morte de muitas mulheres, caso a decisão do STF tivesse sido tomada há mais tempo? Talvez...!
O resultado de dez votos a um dos Ministros do STF confirmou o que escrevi em duas crônicas anteriores, abordando essa mesma lei: afirmava que a Lei Maria da Penha era muito boa, mas muito burocrática, por depender da vontade da vítima. Como assistente social, já defendia esse cristalino entendimento de que a Lei precisaria ser melhorada! Agora foi!
Com a decisão tomada pelo STF, à denúncia de um simples vizinho ou parente terá validade contra o homem agressor e não somente a da própria vítima e se tornará um Crime de Ação Pública, com a titularidade passando direto ao Ministério Público.
Com o resultado do julgamento, uma a cada seis mulheres brasileiras poderiam em tese, ter evitado muitas mortes. Escrevi em tese, porque as Delegacias, com raras exceções, estão completamente desaparelhadas para cumprir a nova decisão, contando com psicólogos, assistentes sociais e casa de acolhimento para que não configure à mulher o abandono de lar quando, nesse caso, a vitima perde todos os seus direitos.
Aprovada em 2006 para combater e punir a violência doméstica contra a mulher socialmente frágil, 330 mil processos foram instaurados, 9,7 mil agressores foram presos mais alguns desses, depois de soltos, alguns até antes mesmo, mataram suas mulheres ou companheiras, como aconteceu com a procuradora da República em MG, Ana Alice Moreira de Melo, assassinada pelo esposo, o empresário Djalma Veloso, de quem estaria se separando. Acredito que esse crime também, tenha indiretamente, influenciado no resultado do julgamento dos ministros.
Pela decisão do Supremo Tribunal Federal qualquer pessoa, vizinho ou um parente, poderá comunicar à polícia as agressões físicas sofridas pela mulher e a vítima não poderá retirar a queixa. Mas há aqui, um risco e uma possível confusão que entendo que o STF cometeu: uma simples discussão de casal, sem agressão física consumada se for denunciada e não confirmada em exame de Corpo de Delito, também não poderá ser retirada?
Como assistente social, observe que o STF avançou quando ao aspecto da Lei, tornando-a em um crime de ação pública e não mais privada, dependente da vontade da vítima, porque como afirmou o Ministro Marco Aurélio de Mello, em 90% dos casos em que ocorre representação, o homem fica bonzinho por uns tempos e há sempre um recuo mediante uma livre manifestação da vontade da vítima.
Mas, será que os Estados estarão realmente aparelhados para fazer cumprir essa nova decisão, como determina a Lei Maria da Penha? Entendo que não, porque a maioria dos Estados não contratou assistentes sociais, psicólogos ou construiu casas-abrigo para que as mulheres deixarem momentaneamente seus lares, permanecerem em abrigadas e protegidas para depois retornem as suas antigas residências sem que isso fique configurado um “abandono de lar”, previsto no Direito de Família.