...dos tempos em que duas sandálias havaianas ou duas pedras no meio de uma rua qualquer, em um bairro qualquer, serviam de traves para a garotada a jogar bola até ao anoitecer;
...depois seguir rumo às cacimbas no bairro da Betânia, para um banho tirando água com cuias, era um grande refrigério depois da acirrada disputa futebolística; alguns até tremiam tão frias eram as águas das cacimbas com madeira em volta e uma tampa com cadeado para não “toldarem”.
...do Igarapé do 40, com águas límpidas e transparentes, areia branca ao fundo, capim por todo lado, dentro do qual meninos nadavam entre os pés de mato que lhes emprestavam um ar de docilidade;
...de Pedro Alves da Silva, o “seu Padrinho”, um dos primeiros comerciantes do bairro da Betânia, estabelecido em uma casa de alvenaria de dois andares; da “Casinha Branca”, onde eram feitos os pagamentos mensais dos lotes adquiridos;
...dos pés de cajus que existiam na Betânia; do número 68 da Avenida Adalberto Vale, onde morei; das brincadeiras na rua sem preocupação com assaltos; mesmo sem luz elétrica, água ou asfalto, as crianças e adolescentes eram mais livres e felizes;
...das sandálias havaianas que usava mesmo quebradas; colocava um botão ou um prego embaixo delas para prender a correia nos pés e as usava até o calcanhar arrastar no chão por desgastar a sola de borracha;
...do terreno cheio de mato que existia do outro lado da Avenida Adalberto Valle, onde meu pai estacionava o caminhão verde e velho, mas que sustentou por algum tempo a família, com fretes ou carretos; embora houvesse dificuldade para fazer funcioná-lo todos os dias porque ainda era à manivela;
...da primeira “televizinha” na casa de dona Raimundinha; dos meninos que se aglomeram em sua casa ou olhavam pela janela; da Maria José, moça fogosa que desfilava pela Avenida com os garotos a paquerando e, ela, não dando bola para ninguém;
...da classificação das mulheres “virgens” e “não virgens” que os meninos faziam quando desciam do ônibus na Avenida Getúlio Vargas, para ver filmes de Tarzan no cinema Guarany: toda mulher que usasse calças compridas, se tivesse as pernas bem unidas, “com certeza, era ainda virgem”; caso tivesse qualquer coisa entrando entre as pernas, “não era mais virgem”.
...dos tempos em que os adolescentes começavam a namorar só depois de seus 16 ou 17 anos e eram inocentes até para beijar “de língua”...
...ah, como sinto saudades de adquirir os livros que contavam histórias da espiã da CIA, Brigitte Montford, a “Baby”, descrita com alta, com pele dourada e olhos azuis nas páginas de um livro de bolso da coleção ZZ7, da Editora Monterrey com seus vários espiões auxiliares Jonhy I, Jonhy II ou Jonhy III; como aguçava a imaginação da meninada nos anos 70 quando não se falava sobre sexo;
Além das revistas coloridas de Tarzan, a meninada parava sempre em uma banca na Avenida Getúlio Vargas, próximo ao Colégio Estadual e antes de chegar à Avenida 7 de Setembro, para adquirir as revistas com a criação do escritor espanhol Antonio Vera Ramirez, que assinava com o pseudônimo de “Lou Carrigan”, com novas histórias da espiã da CIA;
Ah, quantas saudades sinto dos tempos que não voltarão nunca mais!