Enquanto o poeta-cantor de Parintins Chico da Silva com seu parceiro Venâncio compunha no Rio de Janeiro a música “Pandeiro é Meu Nome” com a qual fizeram brilhar, em 1977, a estrela da cantora Alcione, com uma vendagem de 400 mil cópias conhecida também pelo carinhoso apelido de “Marron”, o balneário distante do centro urbano da cidade de Parintins, no meio do mato, conhecido por “Buraco da Rosa”, e o restaurante “Piroca da Gadelha”, faziam a alegria dos poucos turistas que se deslocavam de outros municípios próximos à cidade, o prefeito Raimundo Reis Ferreira, o Xibiu, três anos depois, percorria as redações dos jornais em Manaus, pedindo que algum jornalista fosse designado para divulgar o ainda XII Festival Folclórico da cidade, mas recebendo de seus proprietários um “não” como resposta, justificando que “ seus funcionários só iam lá para beber”, o que não era de todo uma mentira!
O Balneário “Buraco da Rosa”, longe do centro urbano do município que tem Nossa Senhora do Carmo como padroeira e o restaurante- bar “Piroca da Gadelha”, um dos poucos que existiam na época com qualidade, funcionando em um flutuante ao lado de um ponta de terra onde se formava uma “pororoca”, como também chamavam – acho que devido a isso o local ficou conhecido como “Piroca” – de “rebojo” devido ao represamento e velocidade das águas do rio Amazonas, eram os dois pontos turísticos mais procurados depois que acabava a apresentação dos Bois Garantido e Caprichoso, quase amanhecendo o dia!
Tirei minhas férias do Jornal A NOTÍCIA, no período do festival no ano seguinte e, em um avião DC3, pilotado pelo proprietário da empresa Rico Taxi Aéreo, Munur Yurtseverl, que adorava e já conhecia o festival, pousamos em uma parte da pista do Aeroporto Júlio Belém. Em outra parte da pista já se encontrava montado o tablado de madeira que serviria para a apresentação dos bois Garantido e Caprichoso. Yurtservel, nascido na cidade de Scopje, na Macedônia, antiga Yugoslávia, executou várias missões na 2ª Grande Guerra. Mas naquela oportunidade se rebelara contra o regime comunista de seu país e fugiu para a Turquia, quando, anos depois, nem imaginava que estaria a caminho de se transformar em um dos mais lendários aviadores do Brasil, conhecido também pelo carinhoso apelido de “Mickey” devido à dificuldade da pronúncia de seu primeiro nome. Era um apaixonado pelo folclore do Amazonas e frequentava o de Parintins todos os anos.
Recebendo diversos “não”, nas redações de A CRÍTICA, A NOTÍCIA e o JORNAL DO COMÉRCIO, o então prefeito Raimundo Reis, pelo menos, conseguiu despertar o desejo de alguns profissionais em participar do festival no município, mesmo que fosse só para beber e nada escrever. A cidade de Parintins era uma ilha de 5.952 Km2, descoberta em 1749 pelo explorador José Gonçalves da Fonseca, representando 0,1545% da região norte brasileira e 0,0701% do território, mas nada representava no cenário do Amazonas, do Brasil e nem do mundo, a não ser pela imensa criação de gado. Era só mais uma ilha no meio do nada, mas o prefeito Raimundo Reis queria mudar isso! E mudou, com perseverança, determinação e trabalho de convencimento!
No avião do comandante Mickey, apelido que incorporou com bom humor, quando passou a cruzar os céus da Amazônia no comando de pequenas aeronaves que serviam ao garimpo na região, inclusive seu DC3, transportou vários jornalistas de uma só vez à cidade de Parintins: eu, Orlando Farias, correspondente de um Jornal de São Paulo, à época, José Ribamar Garganta, do Jornal do Comércio, Sandra Monteiro, que trabalhava em uma TV, o fotógrafo João “Pinduca” Rodrigues e outros.
Marcos Santos, que era filho da terra, todos os anos “brincava no boi”, na comissão de frente, como chamavam. Os jornalistas de Manaus tinham que se apresentar também, um dia em um boi e outro dia em outro, na comissão de frente, “para não demonstrarem preferência por nenhum”. O radialista Marcos Santos providenciou uma roupa da comissão de frente e me apresentei um dia no Caprichoso e, por não terem conseguido roupa na comissão de frente do Garantido, não me apresentei. Mas isso não era comum.
Depois de beber e assistir ao Festival seguimos todos cambaleantes rumo ao prédio do empresário Zezinho Faria, onde nos hospedávamos. Em um fusca alugado, decidimos emendar a farra e fomos todos conhecer o famoso bar à margem do rio Solimões, conhecido na cidade como “Piroca da Gadelha”, mas ficaram dormindo a jornalista Sandra Monteiro e o fotógrafo João “Pinduca” Rodrigues. Seguimos os outros para procurar o tal restaurante famoso.
O fusca pregou por falta de gasolina. Decidimos continuar o caminho a pé, sentindo o frescor da brisa que vinha do rio Amazonas e apreciando uma paisagem deslumbrante, em busca do “Piroca da Gadelha”. Fomos passando por baixo de mangueiras que emprestavam um ar bucólico à rua, mas o jornalista Ribamar Garganta decidiu urinar ao pé da uma daquelas frondosas árvores. Na hora, passava uma motocicleta, hoje muito usada como triciclo - comum no município - e atirou para cima a fim de espantar os “cachaceiros”. Todos se assustaram!
Passado o susto do tiro, o Ribamar Garganta, que nem respondia aos nossos chamados, havia subido no pé da mangueira e não sabia como descer – não sei descrever como ele subiu tão rápido. Próximo ao local, encontramos uma escada e ele desceu.
De volta a Manaus, escrevi e publiquei a crônica PARINTINS FANTÁSTICO, registrando alguns desses fatos. Nunca havia visto Festival tão empolgante, organizado, disciplinado, com um povo tão obediente aos comandos. Na crônica que publiquei naquele ano em A NOTÍCIA, mereceram mais destaques o Balneário “Buraco da Rosa”, e o Bar e Restaurante “Piroca da Gadelha”.
Nesse Festival que relembro com saudade, a cobra grande engoliu um pescador, um gigante imenso entrou no tablado de madeira no Aeroporto Júlio Belém e uma tartaruga colocou um ovo. Fantásticas lembranças!